No último episódio, vimos como a morte de Roger Delgado (o primeiro Master) abalou profundamente a vida de Jon Pertwee, levando-o por fim a se convencer que era hora de deixar a TARDIS sob nova direção. Os produtores de “Doctor Who” começaram a procura ainda em 1974, enquanto Pertwee filmava suas últimas participações como o Doutor. As bolsas de apostas estavam em polvorosa – quem seria, afinal, o novo rosto do papel mais cobiçado da TV britânica?
A escolha foi, no mínimo, um choque. Quem diabo era aquele sujeito alto e desengonçado que ninguém tinha visto antes? E que diabo, meu Deus, era aquele cachecol?!
101 usos para o Cachecol do Quarto Doutor. É, alguém contou.
Bem, o sujeto desengonçado era Thomas Stewart Baker – o primeiro Doutor a nascer fora de Londres (era de Liverpool), a não ter lutado na Segunda Guerra Mundial (nasceu em 1934) e a não ter vivido exclusivamente como ator (ele começou no teatro como um hobby de fim de semana). De família classa baixa, abandonado pelo pai (o marinheiro John Baker), Tom foi criado pela mãe, Mary Jane, uma católica devota – o que o levou, aos 15 anos, a entrar em um mosteiro para se tornar padre, em 1955.
A personalidade explosiva de Baker, porém, não cabia dentro de uma batina, e ele largou o seminário – primeiro para fazer o então obrigatório serviço militar (de 1955 a 1957) e depois como ator em tempo quase integral. “Quase” porque, embora ele fizesse parte da companhia de teatro do ator Oliver Reed, e com ele conseguisse alguns papéis de destaque nos palcos, não dava para ganhar a vida somente como ator _ e, para completar a renda, Tom Baker trabalhava durante o dia como… pedreiro!
Foi o diretor Bill Slater, que tinha trabalhado com Baker anteriormente, que recomendou o ator para Barry Letts, o produtor de “DW”. Praticamente desconhecido do público e sem um tostão no bolso, Baker foi apresentado para a imprensa com roupas “emprestadas” do departamento de figurino da BBC _ ele não tinha um terno que prestasse para a ocasião… A sua primeira participação foi ao ar em 28 de dezembro de 1974, com o episódio Robots. Baker estava a um mês de completar 41 anos. A transição não foi tão fácil quanto pareceu: os autores da série precisaram de um bom tempo para pegar o ritmo do novo Doutor. Não dava para manter o texto com o ar pomposo de Pertwee quando o novo intérprete fazia questão absoluta de não ser pomposo, muito pelo contrário…!
O famoso cachecol listrado – que mede nada mais, nada menos que três metros e meio – foi culpa do mesmo departamento de figurino da BBC. James Acheson, o desenhista do figurino, não sabia quanto de lã comprar para fazer o cachecol que tinha imaginado, baseando-se em uma série de quadros do francês Toulouse-Lautrec. Ele exagerou na compra sem saber e passou a encomenda para a tricoteira Begonia Pope que, sem instruções precisas de tamanho ou modelo, acabou por tricotar todos os novelos recebidos!
Um dos quadros que inspirou o figurino do Quarto Doutor
Tom Baker, ao ver o resultado da confusão, decidiu usar o produto assim mesmo, já que seu Doutor era, no mínimo, um excêntrico. Adeus o dândi de cabelos brancos e ternos coloridos vivido por Pertwee _ agora o homem de Gallifrey tinha um humor imprevisível e até mesmo meio sombrio e triste, apesar do sorriso. Ele abusava dos casacões e dos chapéus, era viciado em balinhas “jelly babies” e, depois de tanto tempo preso na UNIT, estava louco para voltar a correr o mundo. É partir desta encarnação que os problemas do Doutor com os Time Lords realmente começam… e isso é assunto para a próxima parte da série…
Tom Baker e Terry Nation, o criador dos Daleks, em reportagem da “Radio Times”. A verdadeira origem dos saleiros mais temidos deste espaço-tempo será contada por eles…