No episódio passado, vimos como dois grandes amigos – Jon Pertwee e Roger Delgado – acabaram se enfrentando como inimigos mortais diante das câmeras interpretando Doctor e Master. Aparentemente, tudo tranquilo no reino de DW: com um novo inimigo em cena para alem de Daleks e outros malucos siderais, o time de autores finalmente consegue circunavegar a falta crônica de verba da BBC e as limitações de cenário, mantendo a série no ar com sucesso. O Doutor aos poucos começa a voltar para o espaço – e o Terceiro Doutor, depois de tanto tempo preso na Terra, se atira nas oportunidades de viajar como uma criança com crédito ilimitado numa loja de doces.
Entre o fim de 1972 e começo de 1973, a BBC coloca no ar uma série de quatro episódios para celebrar uma efeméride que Sydney Newton não imaginava nem nos seus sonhos mais malucos: Doctor Who completa dez anos no ar. Para isso, a produção coloca lado a lado as três encarnações do Doutor para trabalhar em conjunto, em um arco chamado, obviamente, The Three Doctors.
Hartnell, Pertwee e Troughton, na única vez em que estiveram juntos em cena
Na história, Gallifrey está em perigo e só existe uma pessoa que pode ajudar o planeta a escapar da extinção pela eternidade: seu filho renegado, o Doutor. Como nem ele dá conta do problema sozinho, a solução é chamar suas encarnações passadas para ajudar. Só o conflito de personalidades entre a ranhetice do Primeiro Doutor, a distração do Segundo e o jeito meio mandão do Terceiro já garante risadas à beça. Juntando-se a isso o Brigadeiro (que já tem trabalho o suficiente com um Doutor e de repente se vê lidando com três deles ao mesmo tempo) e toda a tensão de lidar com o Presidente de Gallifrey (que exilou o Doutor no passado) e temos aí um episódio clássico, inclusive reeditado em DVD.
Os bastidores da produção foram complicados: William Hartnell já estava muito doente, e teve sua participação reduzida ao máximo para que ele não se cansasse durante as gravações. Trata-se da última atuação da carreira do ator, que faleceria dois anos depois. Ele teve que ler suas falas em cartazes posicionados atrás da câmera, e não contracenou com Pertwee e Troughton, só encontrando-os para fazer as fotos de divulgação. Os produtores também queriam ter trazido novamente Jamie McCrimmon para o seriado, já que ele era um dos companions mais queridos do público _porém, Frazer Hines estava atrapalhado com as gravações da novela Emmerdale Farm e não pôde participar.
1973 também marca o ano em que Roger Delgado morre em um acidente de trânsito na Turquia, durante as gravações de um filme. Jon Pertwee sente o baque e acaba decidindo que, sem o melhor amigo por perto, as gravações de DW já não tem a mesma graça. No entanto, ele fica mais uma temporada e só deixa a TARDIS em 1974 para voltar aos palcos, sua verdadeira paixão. Ele só vai explicar seus motivos de verdade muito anos depois – na época, ele diz que chegara a hora de partir, simplesmente.
O Terceiro Doutor morre no episódio “Planet of the Spiders”, envenenado por radiação mortal que ele absorveu para salvar seus amigos de um ataque (sim, há certas semelhanças com “End of Time”, mas elas terminam aí). A companion da época é Sarah-Jane Smith (Elisabeth Sladen), que está com Pertwee no momento da morte do Terceiro Doutor e sua regeneração – aliás, o termo “regeneração” é usado e explicado pela primeira vez neste episódio, que foi ao ar em oito de junho de 1974.
Diante de um suspiro do Brigadeiro, dizendo “bom, lá vamos nós de novo…”, começa a era daquele que muitos acreditam ser O Doutor por excelência. E como foi que um ex-seminarista que nunca tinha feito nada na televisão se tornou um dos Doutores mais icônicos de todos os tempos é o assunto de nosso próximo episódio….
O maior cachecol do sistema solar foi um erro da produção, sabiam?