No episódio passado, vimos como Jon Pertwee assumiu o comando de uma TARDIS presa ao chão, já que o Doutor estava condenado ao exílio na Terra por conta de suas intromissões na linha do tempo. Ao lado de Liz Shaw, a cientista que trabalhava para a UNIT (interpretada pela recém-falecida Caroline John), o Terceiro Doutor conquistou a platéia com seus ternos extravagantes e roteiros mais ousados.
E ponha ousado nisso: o primeiro capítulo da segunda temporada de Pertwee, “Terror of the Autons”, foi considerado tão violento que se tornou alvo de reclamações de vários setores da sociedade, incluindo Mary Whitehouse, uma dona-de-casa e ativista que se tornou famosa na Grã-Bretanha por fazer protestos contra programas considerados impróprios para os menores de idade (nós a veremos novamente quando Tom Baker se tornar o Doutor – a história, meus amigos, é longa – nada que abalasse a audiência, mas um sinal claro que de as coisas já não eram mais as mesmas com o Homem de Gallifrey).
Trivia: os mais novos ficarão feliz em saber que “Terror of the Autons” foi homenageado no primeiro episódio da nova série, “Rose” – Christopher Ecclestone enfrentou a Consciência Nestene com as mesmas armas de Jon Pertwee. A sequência em que os manequins quebram as vitrines das lojas em “Rose” é uma referência a uma cena que os produtores de DW queriam ter colocado em “Terror of the Autons” – mas, adivinhem?, não puderam porque o orçamento não cobria…
O fato é que o Doutor precisava de um nêmesis, já que, preso à Terra, não podia sair por aí interferindo em fatos históricos _e invasões aliens ou cientistas loucos podem ser legais, mas não rendiam história toda semana. O time de autores decidiu então criar um “Moriaty para o Sherlock Holmes do Doctor Who” – e em 1971 surgia o Master, justamente no episódio “Terror of the Autons”.
A gangue toda: a TARDIS, Master (Roger Delgado), Doutor (Jon Pertwee), Jo Grant (Katy Manning) e o Brigadeiro (Nicholas Courtney) em 1971
O nome do personagem foi deliberado: o produtor Barry Letts e o chefe dos autores, Terrance Dicks, queriam algo que remetesse aos supervilões dos quadrinhos, mas que estabelecesse de cara a inferioridade do sujeito em relação ao personagem principal (na
academia, master é quem tem o título de mestrado; doctor é o título logo acima na escala).
Barry Letts criou o personagem com um ator em mente: Roger Caesar Marius Bernard de Delgado Torres Castillo Roberto, ou simplesmente Roger Delgado.
Delgado, mãe franco-belga, pai espanhol, nascido no tradicional bairro de Whitechapel em Londres em 1918, tinha cacife para o que lhe era pedido, com vários vilões de sci-fi no currículo. Para completar, ele era grande amigo de Jon Pertwee, e não quis perder a oportunidade de trabalhar ao lado dele. Muita gente atribui o sucesso do personagem à química entre os dois amigos, que adoravam duelar em cena e fazer bagunça nos bastidores _ Delgado, apesar da cara de mau, é lembrado pelos colegas como um homem extremamente gentil e simpático.
Tudo parece OK no cenário: os textos vão bem, o Doutor tem seu inimigo, a TARDIS continua presa à Terra, e as companions – Liz Shaw, Jo Grant (Katy Manning) e a inesquecível Sarah Jane Smith (Elisabeth Sladen) – seguram bem a barra (falaremos mais delas em breve). O que pode dar errado?
Isso é o que saberemos a seguir…